Silêncio
de olhos verdes
Era
uma viagem normal. Ao menos, parecia normal. Passagem comprada e logo estaria
de volta, em casa, depois de um fim de semana esplêndido na companhia dos
amigos. Especialmente pela companhia daquele amigo.
Feliz.
Estava realmente feliz ao se acomodar na poltrona de número 10, perto da porta,
longe do banheiro, na fileira do motorista, como lhe ensinara a avó.
Porta
fechada e as instruções.
Primeira
etapa da viagem, tudo em paz. O motorista cantarolava uma canção conhecida,
muito antiga. Por vezes, assobiava. O ônibus era confortável, reclinava quase
como um leito; perfeito!
Ouvia
músicas quando de repente ouviu um ruído que parecia indicar que aquilo tudo
era um sonho. E que era hora de acordar.
--
Foi o tambor. Tenho certeza que foi o tambor. – repetia o motorista levando as
mãos à cabeça.
Desceram todos, ela inclusive, no meio da
estrada, o sol a pino e um ônibus quebrado na beira da estrada.
Em solidariedade ao motorista, outros ônibus
paravam e ofereciam carona aos pobres desalentados.
Pouco
a pouco, sumiram os outros. Na vez dela, parou um ônibus esquisito,
visivelmente velho e mal cuidado. Hesitou. Pensou, porém, que ainda iria
trabalhar naquele mesmo dia que já apontava sua segunda metade e decidiu
embarcar assim mesmo.
Estava
certa, o ônibus era péssimo! Já rodava há 3 dias, vinha de longe, muito longe e
não cheirava bem...
Não
por culpa das pessoas, mas é que ônibus que roda há mais de 1 dia na estrada,
sem parar, não pode mesmo cheirar bem.
Aproximou-se
de um banco vazio. Ao lado, uma senhora de olhos verdes e lenço na cabeça a
olhava como se a esperasse há muito. Pediu licença e sentou-se. Acomodou-se
como pôde, sentiu dificuldade extrema em acomodar suas longas pernas mas
conseguiu, enfim, se ajeitar.
Ao
lado, a senhora a olhava, fixamente como quem deseja perguntar algo. Ninguém
sabe porquê, mas ela nada dizia.
Aquele
silêncio complacente ia-lhe corroendo o
espírito, mas nada podia fazer a não ser esperar.
Esperou.
Esperou e repetiu a espera.
A
viagem chegou ao fim. A senhora, a olhá-la fixamente como quem deseja perguntar
algo.
Não
houve pergunta. O ônibus parou, todos desceram. A senhora de olhos verdes
também e, com um sorriso e um aceno, já ao longe, tentou enfim lhe dizer o que
tanto a angustiara a viagem toda...
Não o
pôde. A família que a aguardava no desembarque, sufocou-a com uma chuva de
beijos e abraços infindos. Era uma festa linda de se ver, em plena rodoviária.
Todo
aquele silêncio, já de malas nas mãos, a fez olhar para trás pela última vez.
Percebeu
então que havia uma semelhança muito grande entre uma menina que abraçava a
senhora e sua própria imagem, embora aquela parecesse bem mais magra e alegre
que ela, dadas as circunstâncias da penosa viagem.
E foi
assim que o silêncio sem fim teve, ao menos, explicação.
2 comentários:
Kerida,
Sabes k sou teu admirador e admirador da tua "prosa".
Há momentos em k encontro poesia na prosa e prosa na poesia. É o caso deste texto. Por favor: Preciso entender melhor. Há muita expectativa que se cria no leitor... E termina como termina...
Bj
Olá, caro Lu,
saudades de postar e de te ler! Espero que estejas bem.
Pois, pergunte, preferi deixar a dúvida e um final a gosto de quem ler esta passagem...acredito na fértil imaginação humana e resolvi de pronto não limitar o ilimitado! Esta passagem termina como tu queiras, dê-me um final? publico-o aqui, se me deixas...
Precisamos falar mais sobre literaturas, me escreve?
um beijo
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